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Tiros vindos do alto, de labirintos inacessíveis para veículos blindados, recepcionam policiais militares em incursões ao
Complexo do Chapadão, na Zona Norte.
Considerado o
quartel-general do Comando Vermelho (CV) por autoridades de Segurança Pública, e
porto seguro para traficantes egressos de várias favelas ocupadas pela polícia, o conjunto de 24 favelas tem hoje para os criminosos o papel estratégico que já pertenceu ao Complexo do Alemão.
Pelas migrações de traficantes, o Chapadão já dá sinais do excesso de mão de obra a serviço do crime. A partilha do lucro faz com que os ganhos já não sejam os mesmos. Com isso, bairros do entorno e cidades próximas, na Baixada Fluminense, sofrem com roubos de cargas e veículos, que complementam a renda de traficantes dispostos a espalhar o terror entre moradores do asfalto.
Seu posicionamento privilegiado entre as Avenidas Brasil, Monsenhor Félix e a proximidade com as Vias Light e Dutra — que liga a região à Baixada Fluminense —, favorece o movimento de entrada e saída de entorpecentes e os grandes saques.
Comandante do 41º BPM (Irajá), o tenente-coronel Antônio Marcos dos Santos afirma ter no resgate de veículos roubados uma de suas prioridades e reconhece que trabalha no “local mais crítico do Brasil.”
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A maioria dos carros roubados no Rio e na Baixada é encontrada no Chapadão. Muitos veículos, mesmo monitorados por GPS, uma vez lá dentro, não são mais resgatados. A geografia do local dificulta incursões. Com becos estreitos, construções verticais e áreas de mata, o acesso se torna impossível.
Crescem também os índices de assaltos à mão armada nos bairros Irajá, Guadalupe e Pavuna”, reconhece o comandante.
E se drogas e os produtos roubados entram com facilidade na região, armas também podem ser encontradas com fartura por lá. Entre fuzis e granadas, o batalhão é o segundo colocado no quesito apreensões de material bélico, só ficando atrás do 14º BPM (Bangu). As 22 armas recuperadas este ano não chegam nem perto do que abriga o local, apontado como o principal paiol do Rio atualmente.
“Não acessamos localidades como o Final Feliz, Parque Esperança e Gogó da Ema. Como podemos acreditar que atingimos números realmente combativos ao crime?”, desabafa um policial lotado no 41º BPM. “Esse aqui é o batalhão da tensão constante”, conclui.
De acordo com policiais da Delegacia de Combate às Drogas (Dcod), no topo da hierarquia da favela, ainda se encontra Márcio dos Santos Nepomuceno, o Marcinho VP. Preso na Penitenciária Federal de Catanduvas (PR) desde 2008, ele ainda daria as cartas na região, segundo a polícia. Seu homem forte por lá, Fabiano Atanásio da Silva, o FB, também encontra-se preso em presídio federal.
Atualmente, as ordens para combate partem de Robson de Aguiar Oliveira, o Binho do Engenho, e Ricardo Chaves de Castro Lima, o Fú da Mineira. Ambos chegaram ao Chapadão após a pacificação do Complexo do Lins e comunidades do Centro. O Disque-Denúncia (2252-1177) oferece recompensa por informações que levem a eles.
A captura dos principais chefes do tráfico ainda parece distante para quem vivencia o terror diário no Complexo do Chapadão. Trilhos de trem concretados no chão, com pneus incandescentes à sua volta, recepcionam policiais. Os veículos blindados fream, mas os PMs não conseguem fazer a retirada das barricadas, por conta da alta temperatura. Muitas vezes, são obrigados a recuar pela ‘chuva de tiros’.
O alerta aos traficantes é, de acordo com o comandante, dado por mototaxistas coniventes. “Focamos os trabalhos, atualmente, na retirada total das barricadas, apreensão de motos irregulares e roubadas, além da identificação dos ‘olheiros’”, explica. Na última terça-feira, 32 motos irregulares foram aprendidas. O local virou um uma espécie de ‘pouso tranquilo’ para criminosos.
“Vários traficantes da Baixada e de comunidades ocupadas do Rio exercem o comando de pontos altos do Chapadão. Poucos são aqueles do Comando Vermelho que não têm casa na região, atualmente”, confirma um agente da Dcod.
Além de tirar a paz da comunidade, traficantes ainda se valem de armas para ocupar outros pontos, inclusive no asfalto. Um exemplo disso é o conjunto residencial Village Pavuna, onde criminosos armados vendem drogas e transitam sem se preocupar com a possibilidade de serem presos. Moradores contam que são obrigados a conviver com a venda de entorpecentes na porta de casa e que têm medo até de sair. “Não posso nem mais receber uma visita”, contou um morador que pensa em mudar, mas não consegue comprador para seu apartamento.
O anúncio de implantação de Unidades de Política Pacificadora (UPPs) nos Complexos do Chapadão e da Pedreira, feito na última semana pelo secretário de Segurança Pública, José Mariano Beltrame — ainda sem data ainda definida — é o sonho antigo de moradores de bairros como Guadalupe, Irajá, Acari, Costa Barros, Barros Filho, Pavuna e Anchieta.
A rotina de tiroteios e roubos nas ruas próximas apavora a população e empresários da região. Entre 16 de janeiro e 23 de fevereiro, a disputa entre traficantes do CV e Amigos dos Amigos (ADA) pelo Morro do Juramento, fechou comércio e escolas locais várias vezes.
Roubos são as queixas mais recebidas pelo Disque-Denúncia (2253-1177). Os registros de veículos abandonados continuam no topo do ranking das denúncias, confirmando a informação da polícia de que o local é o destino final da maioria dos carros roubados no Grande Rio.
Em seguida, os saques à veículos de carga se destacam. Peculiarmente, no Chapadão aportam os grandes lotes de caminhões contendo refrigerantes, cervejas, carnes e frango. As mercadorias são usadas como pagamento à donos de comércios que contribuem com o tráfico. Já no vizinho Morro da Pedreira, são encontradas cargas de cigarros, medicamentos e eletromédicos.
Empresas de frete e logística localizadas na Rodovia Presidente Dutra, temem a proximidade com o conjunto de favelas e a Pavuna. Apesar da escolta dobrada, em muitos casos, os assaltos são invevitáveis. A Polícia Civil investiga a colaboração de funcionários das empresas com informações privilegiadas à criminalidade.
Segundo o 41º BPM (Irajá), de dezembro até 29 de abril, foram 27 presos, além de 10 mortos por intervenção policial. O batalhão é responsável pelo patrulhamento de 46 quilômetros quadrados, 32 favelas, e a segurança de 600 mil moradores da região. As investigações esbarram na dificuldade de acesso: “Para entrar no Chapadão, é necessário um grande aparato. Fica difícil surpreender a criminalidade”, explica o comandante.