As atrações, algumas delas cinquentenárias, seguem até hoje fora do ar, ficando quase inacessíveis aos fãs, que precisam recorrer à pirataria e aos poucos episódios existentes em plataformas de vídeo como YouTube — onde também são paulatinamente derrubados.
Mas o que explica essa situação que parece longe de ter fim? O Fórum Chaves, principal comunidade de fãs dos programas de Chespirito, traz um resumo dos acontecimentos:
Por que os seriados saíram do ar?
Em 31 de julho de 2020, encerrou-se um contrato firmado 20 anos atrás entre Roberto Gómez Bolaños, criador dos programas, e a Televisa, conglomerado mexicano que produziu os seriados.
No contrato, Bolaños cedia à Televisa o direito de explorar e comercializar os programas, realizados a partir dos roteiros que ele escreveu.
Como esse documento não foi renovado — agora, tendo os filhos de Roberto como seus representantes —, os seriados não poderiam ser mais vendidos e exibidos até que haja novo acordo.
Por que o contrato não foi renovado?
As causas não foram reveladas até hoje, mas se supõe que sejam financeiras. No começo deste ano, a atriz Florinda Meza, intérprete da Dona Florinda e viúva de Chespirito, reclamou à apresentadora mexicana Adela Micha que os valores oferecidos pela Televisa eram irrisórios: apenas cinco milhões de dólares (em valores da época) por 20 anos.
Roberto Gómez Fernández, filho de Bolaños, declarou várias vezes sua intenção em chegar a um acordo com a Televisa. A emissora, por sua vez, manifestou-se em uma única ocasião, ao O Globo, por meio de seu diretor de comunicação, Rubem Acosta: "Os programas não estão sendo transmitidos devido a certas discussões sobre os direitos envolvidos. Não podemos comentar mais em respeito às partes envolvidas".
Quais os programas afetados?
Saíram do ar os seriados Chaves (1973-1980), Chapolin (1973-1979) e Chespirito (1980-1995), que vinham sendo exibidos regularmente por canais brasileiros e estrangeiros. As versões animadas não foram afetadas: todas as sete temporadas do Chaves Animado estão no Amazon Prime Video, assim como uma temporada do Chapolin Animado (com dublagem em português de Portugal).
Quem são as partes envolvidas?
Roberto Gómez Fernández, produtor e filho de Bolaños, é quem está à frente das negociações pela família, representada ainda pelas cinco filhas do escritor: Marcela, Paulina, Graciela, Cecilia e Tereza. Eles herdaram a obra do pai, enquanto Florinda Meza, esposa de Chespirito, ficou com os direitos biográficos.
Fernández é diretor do Grupo Chespirito, empresa responsável pelo licenciamento de produtos e gestão das marcas de Chaves, Chapolin e Chespirito. Apesar disso, a companhia não tem gerência sobre as obras audiovisuais.
A Televisa é o principal conglomerado de mídia do México, dona de canais como Las Estrellas e FOROtv. Foi criada a partir da fusão dos canais 2 (Telesistema Mexicano) e 8 (TV TIM), em 1973 — este último, onde Chespirito criou seus primeiros programas na televisão.
Florinda e os demais atores ainda vivos (Carlos Villagrán [Kiko], Maria Antonieta de las Nieves [Chiquinha] e Edgar Vivar [Senhor Barriga]) não estão envolvidos no processo.
Praticamente inacessível
Com o "apagão" de mil dias atrás, o público perdeu praticamente todas as formas de ver os seriados. No Brasil, estavam em exibição no SBT, como acontecia desde 1984, quando os programas desembarcaram no país; no Multishow, que vinha transmitindo desde 2018; e no Amazon Prime Video, que oferecia boa parte dos episódios.
O efeito, no entanto, estendeu-se para outras bandas: antes mesmo do fim do contrato, a Televisa já vinha bloqueando episódios dos seriados no YouTube, chegando até a barrar registros de conteúdos que não eram de sua propriedade, como um capítulo de "Ah! Que Kiko!", aventura solo de Carlos Villagrán. Os canais oficiais também saíram do ar.
O impacto foi sentido também no Facebook, onde diversas páginas de fãs, que publicavam trechos dos seriados, saíram do ar por infringirem direitos autorais. Hoje, os apaixonados pelos programas precisam recorrer a vídeos esparsos em serviços como YouTube e Dailymotion, ou baixá-los em sites de pirataria.
Seriados completaram 50 anos em 2023
Em fevereiro, Chaves e Chapolin celebraram seus 50 anos como seriados independentes. Em 26 e 28 de fevereiro, respectivamente, os programas entraram no ar como as novas atrações do canal 8, agora já parte da Televisa, fundada oficialmente poucas semanas antes.
Até então, ambos eram esquetes do programa "Chespirito", que sucedeu "Os Supergênios da Mesa Quadrada" no antigo canal 8 (TV Tim). Lá, o Chapolin foi o primeiro a surgir, em 1970. O Chaves apareceu em 1972 — um ano depois do que erroneamente se diz, uma vez que o personagem foi criado por uma necessidade de Roberto Gómez Bolaños.
Com a saída de Rubén Aguirre (Professor Girafales) para o então concorrente canal 2, Bolaños ficou sem seu companheiro do quadro "Los Chifladitos". Para suprir a ausência, ele resgatou um personagem de um esquete solto e adaptou para o formato que, depois, evoluiria até chegar ao Chaves que conhecemos. Isso ocorreu em março de 1972.
Posteriormente, Chapolin acabaria em 1979, com um episódio de despedida, enquanto o Chaves ficou no ar até o começo de 1980. Ambos se somaram ao novo programa "Chespirito", que teria ainda outros personagens como Dr. Chapatin, Chaveco e Pancada — e que foi exibido no Brasil pelo SBT como "Clube do Chaves". Essa atração durou até 1995.
Redação: Antonio Felipe, para o Fórum Chaves