. Globo, Record, SBT, Band e Rede TV!, que se digladiam por ibope, enfrentam um inimigo comum que explodiu em audiência de 2005 para cá.
Dados do Ibope obtidos pela Folha revelam que o número de domicílios no país com televisores sintonizados em DVDs, videogames e outros aparelhos cresceu 125% no período. A explosão se refere à faixa noturna (das 18h à 0h), a mais importante para os anunciantes.
Em 2005, a audiência dos DVDs, games etc. foi de 1,6 ponto. Em 2009, saltou para 3,6, o equivalente a 1,92 milhão de domicílios. É mais do que obtiveram Band (3,4) e Rede TV! (2,1) e mais da metade do SBT (6,3), a terceira maior em 2009.
De 2001 a 2009, o número de telespectadores de canais fechados e emissoras menores (como públicas, MTV e Record News) também cresceu e passou de 4,9 para 5,6 pontos.
Nesse período, as cinco grandes redes juntas perderam 4,3 pontos de audiência. É importante ressaltar que o número de televisores ligados no país sofreu pouca alteração - de 58,8 pontos em 2001 para 57,7 em 2009. A oscilação entre cada ano mostra que os brasileiros não estão desligando os televisores no horário nobre - em 2005 e 2006 houve até aumento do número de ligados. Estão, sim, mudando a forma de uso da TV.
Questionado sobre o levantamento realizado pela Folha, Antonio Ricardo Ferreira, diretor executivo do Ibope, comentou que as mudanças são "características de uma sociedade que busca novidades".
A economia do país (especialmente o crescimento da classe C e seu aumento de renda) está diretamente relacionada ao novo cenário. "Hoje mais brasileiros têm acesso a bens de consumo que, até pouco tempo atrás, eram acessíveis só às classes mais altas", analisa o publicitário Adrian Ferguson, vice-presidente de mídia da agência Fischer+Fala!.
O hábito de se sentar no sofá e trocar de canais à mercê da programação das emissoras caminha para a extinção, na opinião de Alexandre Annenberg, presidente da Associação Brasileira de TV por Assinatura.
"O telespectador deixa de ser passivo. Na TV aberta, apesar da TV digital, não houve aumento da interação com o público. A nova geração nasceu com o mouse na mão e quer escolher o quê e quando ver."
É o paraíso para o mercado de DVDs, legal e pirata. "O público prefere o conforto de ver filmes quando e quantas vezes quiser", diz Tânia Lima, diretora-executiva da União Brasileira de Vídeo, segundo a qual foram vendidas 25,4 milhões de unidades de DVD e Blu-ray em 2009, contra 5,9 milhões de DVDs e VHSs em 2001.
Renata Gomes, professora e pesquisadora de novas mídias do Senac, cujo doutorado na PUC-SP é sobre videogames, diz que o levantamento da Folha confirma sua percepção. "Os games são a matriz principal do que essa geração entende como imagem e narrativa."
Ela ressalta, contudo, que por mais que "a hegemonia da TV aberta esteja em xeque", seu alcance ainda impressiona. "Pelas mensagens que recebi na internet e no celular na última terça, parecia ser a única no país que não estava vendo a votação do "Big Brother'", ilustra.
Na mesma linha, Eugênio Bucci, professor de jornalismo da USP, destaca que os jovens, apesar de utilizarem cada vez mais o computador, consomem na internet principalmente o conteúdo produzido pelas redes de TV. "Essa resistência dos canais abertos no Brasil é o dado mais chamativo", avalia.
Sobre o levantamento da Folha, a Globo afirmou que "não se pode dizer que os telespectadores estão deixando a emissora para migrar para outros aparelhos ou TV paga e canais menores".
A Record disse que está atenta à tendência e por isso exibe programas da TV paga, como "House" e "Aprendiz".
A Rede TV! declarou querer "crescer entendendo a mudança e não a reprimindo", a Band, que está "atenta, mas é preciso esperar para observar melhor" e o SBT não comentou.
Dos 4,3 pontos que as grandes redes de TV perderam de 2001 para 2009 na faixa noturna, aproximadamente um terço migrou para TVs fechadas e dois terços, para DVDs, games e outros aparelhos, de acordo com Antonio Ricardo Ferreira, diretor-executivo do Ibope.
Apesar disso, o mercado de TV paga tem dados a comemorar. Na última quarta-feira, a Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) divulgou que o total de assinantes do país chegou a 7,6 milhões em janeiro deste ano (cerca de 25,2 milhões de telespectadores).
A base vem crescendo, turbinada pela entrada das empresas de telefonia no setor, que passou a oferecer TV paga com banda larga e telefone - eram 4,6 milhões em 2006; 5,3 milhões em 2007; 6,3 milhões em 2008 e 7,5 milhões em 2009.
Presidente da Associação Brasileira de TV por Assinatura, Alexandre Annenberg admite que os DVDs, principalmente os piratas, são concorrentes, mas tenta amenizar a disputa: "A TV paga oferece uma sinergia muito grande como o DVD, que são os serviços de PVR [que servem para pausar e gravar a programação]. É claro que a concorrência com qualquer tipo de pirataria é danosa e que o preço da TV paga ainda é um obstáculo para o crescimento", diz Annenberg.
De acordo com Ferreira, não há até agora nenhum televisor na base do Ibope [nos quais são instalados "people meter" para registrar a audiência] que sirva de monitor para a internet.
O instituto e as redes de TV têm o desafio de renovar o modelo de medição de audiência, hoje restrito ao movimento do telespectador entre os canais do televisor. O novo passo é mensurar o acesso ao conteúdo, que pode ser feito no celular, no computador etc., como a Nielsen começa a testar neste ano nos Estados Unidos.
Os números evidenciam essa demanda. Em dezembro de 2001, eram 6 milhões de brasileiros utilizando internet em casa. Já em outubro de 2009, o número chegava a 28,5 milhões, um aumento de 375% (dados do Ibope/NetRatings).
"Hoje há pluralidade no consumo de mídias", resume o publicitário Adrian Ferguson.