Trajetos ainda considerados pela Prefeitura como ativos não existem na vida real para os passageiros, que ficam a ver navios nos pontos à espera do coletivo.
Do ponto final da linha 928 (Marechal Hermes-Ramos), só sobrou a placa e a cabine do despachante. Aos olhos da prefeitura, o serviço funciona de forma regular, como consta no site da Secretaria municipal de Transportes. Na vida real, quem depende do transporte público para fazer esse trajeto está a ver navios desde maio do ano passado, quando a empresa Translitoral, que operava no itinerário, encerrou as atividades.
Caso semelhante ocorreu com a Troncal 8 (Cosme Velho-Rodoviária). Embora devesse ter 25 veículos circulando, ela se tornou uma linha fantasma desde que empresa Estrela Azul fechou as portas, em fevereiro deste ano.
Levantamento do EXTRA com base em monitoramento por GPS da frota de ônibus do Rio de Janeiro mostra que pelo menos 56 linhas, que constam como ativas no cadastro da prefeitura, estão inoperantes.
A falha acontece nos quatro consórcios : são 12 linhas do Internorte, 11 do Intersul, 17 do Santa Cruz e 16 do Transcarioca.
Considerando a frota obrigatória para cada linha, são 472 ônibus a menos circulando nas ruas, o equivalente a 7% da frota atual, que é de 6.852 ônibus, segundo a Secretaria Municipal de Transportes (SMTR).
— Cansamos de reclamar na prefeitura, fizemos dois abaixo assinados e até passeata. Funcionários de outra empresa chegaram dizer que a linha ia voltar. Levaram a cabine, mas depois botaram de volta e nunca mais apareceram. Está abandonada — lamenta o comerciante José Carlos Pereira, de 65 anos, que costumava embarcar no ponto final do 928 na Rua Sirici, em Marechal Hermes.
A aposentada Lucia Elisa da Conceição, de 66 anos, ainda tem esperanças de ver restabelecido o serviço da 346 (Madureira-Candelária). No ponto final, na Rua Domingos Lopes, ainda é possível ver uma placa com o número da linha e o itinerário. O ônibus, no entanto, não passa ali há mais de um ano.
A Viação Madureira Candelária, que operava a linha, encerrou as atividades em maio do ano passado. Na ocasião, o consórcio disse que garantiria o serviço, mas a linha continuou a operar por algumas semanas em horário reduzido e logo se tornou inoperante.
— Agora preciso andar até o mercadão para me deslocar para o Centro — lamenta a aposentada.
Para o promotor Rodrigo Terra, há omissão do município na fiscalização das operações das empresas.
— Há descumprimento do contrato. O município não fiscaliza. E, quando fiscaliza, aplica multas previstas no código disciplinar, que prevê multa máxima de 520 Ufirs (R$ 1.712,83), em vez de aplicar as penalidades previstas no próprio contrato de concessão — diz.
A inoperância de linhas levou o Ministério Público a ajuizar uma ação civil pública contra a prefeitura e os consórcios, em março, pedindo a anulação do atual contrato entre prefeitura e empresas de ônibus.
Dos cerca de 8.100 coletivos que deveriam estar circulando, só cerca de 5.700 estariam nas ruas, com base nos dados de GPS fornecidos pelas empresas.